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quinta-feira, 30 de agosto de 2012

IMPRESSÕES DE DANIELLE (parabens ao blog pela lindaa materia)

As últimas impressões da amiga Danielle Carvalho do blog "Filmes, filmes, filmes!" sobre a respeito da peça "Raimunda, Raimunda" e da Exposição "Espelho da Arte"...

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Na trilha das Reginas


Nestas férias de julho, fiz as malas e embarquei de improviso ao Rio de Janeiro para ver em cena Regina Duarte. Na boca, aquele conhecido gosto de timidez da mulher que, mesmo crescida, ainda teima em viver de sonhos.
Regina entrou em minha vida em meados de 2010 pelas mãos de Porcina. Entrou, não: tomou-a de assalto, invadiu-a sem me dar chances de defesa. Se acham que exagero, passem os olhos por algum DVD da caixa de “Roque Santeiro”, lançada recentemente pela Globo, e observem-na em ação. Há ali dentro 60 horas da maior demonstração de respeito pelo espectador. Desfila a multíplice Porcina: hilariamente enternecedora, ridiculamente maravilhosa, malucamente sensata; a provocar o riso aberto da audiência ao mesmo tempo em que bole com suas entranhas, emocionando-a no mais alto grau. 
Após a experiência eu nunca mais fui a mesma. Tanto que saí no encalço da dona de minha musa-mor, com sede de vê-la repetir aquela escandalosa doação de si, agora na pele de outras personagens. Virei garimpadora de preciosidades do passado. Encontrei muitas Reginas, desdobradas em mulheres fortes, frágeis, loucas, enamoradas, leais (sobre algumas eu falei aqui – os leitores frequentes sabem como sou prolixa no que toca aos meus objetos de devoção). E encontrei-me: tornava-me de novo a menina apaixonada por telenovelas que eu um dia fora. Apaixonada e ludibriada: minha saga rumo ao encontro da criadora de ilusões revela com força esse abandono tão infantil quanto deleitante às sombras reais - meu Deus, tão absurdamente reais - criadas pela arte. 

Rio, 19 de julho. No palco do Centro Cultural Banco do Brasil, Regina desdobra-se em duas raimundas díspares: na centenária habitante de um mundo em ruínas que lembra aquele retratado lugubremente em “A última Esperança da Terra” (1971), com Charlton Heston; e na cearense de lábios leporinos conduzida à riqueza e ao desespero por uma sorte mais madrasta que mãe. Com ela no palco, oito rapazes belos e talentosos, todavia, obnubilados pela luz que ela irradia. As duas partes da peça são interessantes, a segunda é hilária, mas mesmo toda a graça não nos impede de ficar comovidos com o modo peculiar como Regina dá voz ao texto escrito. Mulher pequenina que é, ela cresce no palco mais ainda por conta de sua voz que de seu jogo corporal. Há algo no volume de sua voz, em seu timbre e fraseado, que parece torná-la talhada à poesia. E então comemoro em silêncio a agudeza da D. Maria Sylvia, a professora de declamação (agora já uma querida), por ter percebido e ajudado a reverberar a luz que a menina provinciana trazia dentro de si. Quem fala é a insensata Raimundinha cearense, transformada pelas circunstâncias na cosmopolita Raymonde, mas no acento e nos trejeitos de Regina eu só vejo a minha Porcina, e dou graças ao deus do teatro por materializá-la diante de mim.

Vestindo-se de Raimunda para "raimunda, raimunda", de Francisco Pereira da Silva
Mas aí vamos para os bastidores e descobrimos que a melhor parte do espetáculo ainda estava por vir. Regina pessoalmente é tão atenciosa como sua Raquel, tão meiga quanto Ritinha e louca, louquíssima como Porcina. Num texto muito dileto de Regina, Chico de Assis narra o ofício do ator: a identificação com o papel surge tímida a princípio; pouco a pouco, sem que se dê conta, o artista despersonaliza-se na direção daquele outro que com o tempo se torna tão ele. Chegado ao fim o trabalho, resta ao artista a tarefa de se despir deste ser do qual já está tão impregnado e vestir a túnica abandonada de seu “eu”. A árdua tarefa só se realiza completamente quando outra criatura de papel bate às portas do artista, clamando por se fazer carne. E lá vai ele, humildemente, triunfantemente, novamente outro. Que “eu” resiste a abandono tão grande? Não resiste. Cansado de ser posto de lado, aceita um pequenino espaço no ser já repleto. Regina Duarte é Porcina, Ritinha, Raquel, Helena, e uma carreira de outras, para a alegria dos fãs que querem, ao tocá-la, ver presentificado o sonho criado pela tevê. 


No camarim de Regina, na Exposição "Espelho da Arte, a atriz e seu tempo"

Em 21 de agosto, tenho nova chance de vê-la. É o evento de abertura da Exposição em homenagem aos seus 50 anos de carreira, idealizada por Ivan Izzo, seu admirador desde a infância e agora amigo. A dona da festa surge solicitada como nunca, recebendo dos convidados presentes a retribuição de tudo o que ela lhes deu ao longo de meio século de carreira. Depois de um show estonteante de Zizi Possi, que a ajudou a dar voz à sua eterna Helena de “Por Amor”, Regina sobe ao palco e invoca o texto de Chico de Assis, tradução brilhante do fazer artístico. Ela corta a faixa inaugural, perco-a de vista, mas novamente a encontro no recinto da Exposição: espalhada, multiplicada em tantas outras que a transformaram na Regina que ela agora é. 
O passeio pelas salas-cenários, com seus objetos cênicos originais e recriados, dá-me a sensação de viver também as histórias que ela tão bem soube encarnar. Na sala de jantar dos anos 50, a tevê sintoniza a menina cujo sorriso lindo vende pasta de dente. Ao seu lado, escancarado, o quarto da minha musa: turbantes, bijousfrou-frous e vestido de paetês azuis inclusos. Um pouco mais adiante, numa sala dos anos 70, descubro-a par romântico de Antonio Fagundes numa novela censurada de 76. Nos cenários de Regina, vivo pela primeira vez muitas de suas vidas. A onisciência é tão sedutora que desejo repeti-la um dia mais. 
No quarto dela

No dia seguinte, a casa de Regina abre-se ao público. Depois de passar pela sua sala decinema, sou atraída para o teatro. Em cartaz, o maravilhoso monólogo de Segismundo que fecha a segunda jornada de “A Vida é Sonho” (92), peça montada pela atriz quando eu ainda era moleca. E aí, tenho novamente a sensação de que o elemento de Regina é a poesia. “Remonta ‘A Vida é Sonho’, Regina!”, estou a dizer quase em voz alta, quando ouço atrás de mim a voz tão conhecida. Viro-me, e lá está ela. Mas não é ela! É Rosana Reis, Segismundo, ou quem sabe alguém outro, que ainda está em vias de acontecer e palmilha a casa de Regina no Centro Cultural dos Correios para se inspirar. É ao lado dela que eu revejo toda a exposição, agora calmamente, tornando-me ao mesmo tempo protagonista das tantas histórias por ela vividas e público do espetáculo que ela apresenta para mim – para mim e para todos os demais que visitam a exposição e a reconhecem. Vejo-a da distância, não ouso quebrar a quarta parede. Ser seu público já é suficientemente empolgante, ainda mais enquanto ela, atrevida, esgarça os fios que separam ficção e realidade. Regina-Segismundo. Afinal, “que é a vida? Uma ilusão... toda a vida é sonho, e os sonhos, sonhos são.” 
Em "A Vida é Sonho", de Calderón
Fonte: http://www.eternamenteregina.com/2011/11/do-facebook-do-ivan.html


 * 
post acompanha agradecimentos. Começando pelo Edison, companheiro de bordejos aos cinemas e teatros e na preparação de um livro que acabou saindo melhor que a encomenda; à Kelly, que ele me apresentou no outro dia e já virou minha melhor amiga de infância; à Aninha, amiga virtual que se tornou muito real, e à Andreia, amiga por tabela; à Márcia, de quem recebi o convite para a Exposição, e ao Ivan Izzo e à Raquel Duarte, que tornaram o convite possível.
postado pelo blog regina duarte namorada do brasil lindaaa materia

Um comentário:

  1. Maravilhoso! Nossa ao ler esse post foi como se tivesse lendo como começou meu amor pela Regiana. Um dia ainda vou conhece-la pessoalmente.

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